Impacto da cirurgia bariátrica nos níveis de IGF-I, glicemia, insulina e resistência à insulina em pacientes obesos mórbidos

Antonio Alves, Rosimari Freire, Maria R Alves, José A Barreto, Manoel H Oliveira, Enaldo V de Melo, Fábio Almeida, Juliana Moura, Larissa T Pereira,Bruna França

Universidade Federal de Sergipe, Sergipe, Brasil

Recibido 2011.04.17 Aceptado 2011.05.25

RESUMO: Objetivo: Identificar a influência da cirurgia bariátrica nos níveis de IGF-I, glicemia, insulina e resistência à insulina em pacientes obesos mórbidos. Metodologia: Da amostra fizeram parte dez indivíduos eutróficos que apresentavam IMC < de 25, como grupo controle, e dez indivíduos obesos mórbidos que foram acompanhados nos períodos pré e pós-operatório de 45 dias, submetidos à técnica de gastroplastia vertical com derivação gastrojejunal em Y-Roux por videolaparoscopia (BPGYRL). A análise estatística foi realizada utilizando o teste de Wilcoxon e Mann-Whitney, adotando nível de significância de p<0,05.

Prof. Antonio Alves Jr.

Av. Pedro Valadares, 940/103,

Bairro Jardins, CEP 49025-090

Aracaju – Sergipe – Brasil

79-99827557. aalves@infonet.com.br

Resultados: Houve uma redução significante do peso e do IMC (p˂0,0001) entre os indivíduos obesos, quando comparados nos períodos pré e pós-operatório. O nível de insulina reduziu significantemente com a cirurgia (p=0,0189), reduzindo também a resistência à insulina (p=0,0304), voltando o nível do hormônio nesse período observado para valores sem diferença aos obtidos no grupo controle. Os níveis de IGF-I no período de 45 dias, em média, reduziram, sendo estatisticamente significantes (p=0,0002) em relação ao grupo controle. A glicemia não apresentou diferença significante entre os grupos estudados. Conclusões: Pode-se concluir que a cirurgia bariátrica promove, no seguimento de 45 dias de pós-operatório, redução significante de peso corporal e IMC, diminuição da hiperinsulinemia e da resistência à insulina dos pacientes obesos mórbidos.

PALAVRAS CHAVES: Obesidade mórbida; Bypass Gástrico; Somatomedina C; Insulina e glicemia.

INTRODUÇÃO

A obesidade mórbida tem sido considerada um dos grandes males da contemporaneidade.  Vista hoje como uma doença crônica do metabolismo, com origem genética, a obesidade provoca ou acelera o desenvolvimento de muitas outras doenças e causa a morte precoce.  Calcula-se que, nos EUA, 300.000 pessoas morrem por ano precocemente devido à obesidade e que, no Brasil, este número está entre 50.000 a 100.000 pessoas 1,2.

Tem-se observado que há uma tendência da obesidade de se agregar nas famílias. Halpern 3 explica que essa tendência à obesidade em família é determinada por dois fatores: genético e ambiental. Este último, que em muitos casos predomina, significa maus hábitos de vida, particularmente alimentação inadequada e pouca ou nenhuma atividade física2.

Quando a elevação dos ácidos graxos livres permanece por tempo prolongado, eles têm ação direta sobre a sinalização da insulina muscular e hepática, reduzindo as respostas normais à insulina, isto é, diminuindo a incorporação de glicose pelo músculo esquelético e aumentando a neo glicogênese e o fornecimento de glicose do fígado para a circulação. O excesso de gordura passa a ser muito lesivo ao organismo principalmente quando essa gordura passa a ser acumulada em tecidos que não são os tecidos destinados ao acúmulo normal3.

Para Bertolami 4 a resistência à insulina significa que a insulina circulante não tem sua função normal nos tecidos sensíveis a sua ação, como, por exemplo, músculos esqueléticos, tecido adiposo, fígado e endotélio4. A resistência à insulina é usualmente acompanhada por um aumento compensatório da secreção de insulina pelo pâncreas para suplantar a dificuldade de ação da insulina nos tecidos periféricos, a fim de manter os níveis glicêmicos dentro da faixa do normal4. Bertolami 4 ainda refere que a resistência à insulina concentra-se em certas famílias, sendo determinada por fatores genéticos e ambientais4.

Vários estudos têm mostrado que o hormônio do crescimento (GH), mediado pelo IGF-I  ̶ Fator de Crescimento Semelhante à Insulina – além de influenciar no crescimento corpóreo linear, desempenha também importante papel no metabolismo, no perfil lipídico, na composição corporal, no estado cardiovascular e no tempo de vida. A insulina juntamente com o IGF-I está implicada na síntese de esteróides, que contribuem para a piora da resistência à insulina3.

Nesse sentido, o excesso de gordura intra-abdominal, como o que ocorre em homens com obesidade central e em mulheres pós-menopausa, predispõe esses indivíduos às complicações da resistência à insulina. Estas complicações incluem um maior risco para a doença cardiovascular, como evidenciado pela presença de distribuição anormal de lipoproteínas (aumento de triglicérides e diminuição de HDL – colesterol), aumento dos níveis plasmáticos de glicose e insulina em jejum e diabetes do tipo I 4.

Estudos têm demonstrado que a redução da massa corporal, em especial da gordura, pode refletir consideravelmente no perfil lipídico, alterar o metabolismo dos carboidratos, diminuírem a morbidade e a mortalidade e ainda melhorar consideravelmente a qualidade de vida de pacientes obesos mórbidos5.

Em função disso, tem se buscado a superação desses problemas por diversos caminhos, como: dietas, remédios, exercícios e técnicas cirúrgicas. Nesse sentido, as cirurgias bariátricas têm demonstrado ser um meio mais eficaz no manuseio e na profilaxia das complicações da obesidade, sendo o propósito primário a diminuição do risco das morbidades e mortalidades e, só secundariamente, a diminuição de peso como forma cosmética, não devendo assim, ser vista como cirurgia estética 6.

Por se tratar de uma cirurgia de grande porte, em indivíduos com condições mórbidas associadas, que aumentam as chances de complicações pós-cirúrgicas, a cirurgia da obesidade traz consigo riscos que não podem ser menosprezados 7.

As principais indicações para a cirurgia bariátrica são: obesos com IMC>40 ou com IMC>35 associado a doenças clínicas descompensadas pela própria obesidade. A técnica atual de maior uso, considerada “padrão ouro”, consiste na BPGYRL. Trata-se de redução da capacidade gástrica, restringindo-se também, em grau de menor importância, a absorção dos alimentos 8.

Assim como as técnicas cirúrgicas vêm sendo reavaliadas e melhoradas, o sistema de análise da eficiência das cirurgias é alvo do mesmo processo e novas versões ou pequenas alterações surgem. Nesse contexto, a presente pesquisa objetiva analisar os níveis de IGF-I, insulina, glicemia e resistência à insulina em pacientes obesos mórbidos comparativamente a indivíduos não obesos, bem como analisar se existe diferença entre esses níveis aferidos antes e após a cirurgia bariátrica.

Metodologia

A presente pesquisa trata-se de um estudo pros-pectivo analítico com pacientes obesos mórbidos do Serviço Integrado de Gastroenterologia e Obesidade no Estado de Sergipe (SIGO).

O projeto desta pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos (CEP/UFS) e a realização do trabalho seguiu as orientações da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

A amostra foi composta por conveniência com indivíduos de ambos os sexos (10M:10F), com idades variadas, mas sem diferença significante (p=0,1043) entre as médias etárias dos grupos, sendo distribuídos em três grupos:

• Grupo Controle: composto por 10 indivíduos (5M:5F) ditos como eutróficos, ou seja, com um IMC ˂ 25, e com média de 29 ± 12,11 anos de idade.

• Grupo Pré-operatório: composto por 10 indivíduos (5M :5F) obesos mórbidos, com média de 37,5 ± 8,6 anos de idade, e com indicação de cirurgia bariátrica, ou seja, que apresentavam IMC>40 ou IMC > 35 apresentando comorbidades associadas.

• Grupo Pós-operatório: fizeram parte deste grupo os mesmos 10 pacientes obesos do grupo anterior e que haviam realizado a cirurgia bariátrica com 45 dias de pós-operatório.

Os critérios de inclusão empregados foram: indivíduos de ambos os sexos, entre 18 e 60 anos de idade, com IMC<25 (grupo controle) e IMC> 40 ou de 35 com comorbidades associadas (grupos pré e pós-operatório).

Dentre os critérios de exclusão: estar com alguma doença ou condição clínica associada, como: câncer, coma, lesão neurológica, doença grave ou terminal, indivíduos com doença cardiorrespiratória ou ósteo-articular incapacitante, ou ainda presença de confusão mental ou dificuldade de diálogo e entendimento. Além da recusa de participar da pesquisa.

Após os pacientes serem distribuídos nos seus respectivos grupos, foram feitas as pesagens e mensurações desses e solicitados exames laboratoriais de dosagem de IGF-I (somatomedina C), da insulina basal e da glicemia de jejum. Para os indivíduos de grupo pré-operatório, além desses exames, foram solicitados também os exames de rotina de pré-operatório.

Para este estudo, foi padronizada a dosagem de IGF-I com a utilização da metodologia ensaio imunorradiométrico (IRMA); para a dosagem de glicemia, o método glicose oxidase; e para a dosagem de insulina, a metodologia de eletroquimioluminescência automatizada, a partir de 1 c/c de soro 9.

A partir dos níveis basais de glicemia e insulina, foram calculados os índices de HOMA-IR, a partir da fórmula: HOMA-IR=glicemia de jejum (mg/dL) x FC x insulina basal (uU/mL) / 22,5, sendo o FC (fator de conversão de mg/gL em mol/mL) = 0,056 10,11.

A abordagem cirúrgica realizada foi através da BPGYRL que é composta por componente restritivo e disabsortivo.

Para a análise estatística dos resultados, consideraram-se a média e o desvio padrão. Na comparação de grupos diferentes, como no caso dos indivíduos não obesos comparados com os obesos “pré” e “pós-operados”, foi aplicado o teste de Mann-Whitney para duas amostras independentes e para a comparação do mesmo grupo de obesos antes e após a cirurgia bariátrica foi aplicado o teste de Wilcoxon pareado. Com a finalidade de detectar diferenças estatísticas significativas entre os valores encontrados, foi adotado o nível de significância p˂0,05.

RESULTADOS

Observou-se diferença significante entre a média de peso e IMC entre os indivíduos obesos, quando comparados aos do grupo controle (p ˂ 0,0001), bem como entre os pacientes dos grupos pré e pós-operatório. Mesmo com redução de peso e IMC, os pacientes do pós-operatório ainda mantiveram-se diferentes dos indivíduos controle.

Os valores médios da avaliação antropométrica e laboratorial dos indivíduos em estudo podem ser visto na tabela 1.

Não houve diferença significante (p=0,14) nos níveis de glicemia entre os indivíduos do grupo controle (média 80mg/dL ± 5,71) e grupo pré-operatório (média 95mg/dL ± 27,38), como também não houve diferença estatística significativa (p=0,8) entre os grupos pré e pós-operatório quando no pós-operatório o grupo apresentou média de 86mg/dL ± 8,76.

Na análise da variável insulina, observou-se que houve uma diferença significante do nível do hormônio entre os grupos controle (10uU/mL ± 4,92) e pré-operatório (41uU/mL ± 37,12; p=0,01). Para a mesma variável, notou-se que houve também uma redução significante, quando se comparou os grupos dos obesos em período pré-operatório (média 41uU/mL ± 37,12) e pós-operatório (média 11uU/mL ± 5,01; p=0,02). Ainda em relação aos níveis de insulina, não houve diferença significativa entre os grupos controle (10 uU/mL ± 4,92) e pós-operatório (11uU/mL ± 5,02; p=0,74).

Entre os pacientes estudados, foi observado que os componentes do grupo controle apresentaram níveis reduzidos de resistência à insulina (1,96uU/mL ± 0,94) quando comparados ao grupo pré-operatório (10,14uU/mL ± 9,99; p=0,03). Após a cirurgia bariátrica, foi observado que houve uma redução estatisticamente significativa (p=0,02) da resistência à insulina. Pode ser observado que os obesos em tempo pré-operatório tiveram média HOMA-IR de 10,14uu/mL ± 9,99 e o grupo pós-operatório uma média de 2,26uU/mL ± 1,16. Verificou-se que não houve diferença significante entre os grupos controle (1,96uU/mL ± 0,94) e pós-operatório (2,26uU/mL ± 1,16; p=1,0), com relação aos valores médios de HOMA-IR.

Quanto a variável IGF-I, houve uma diminuição com diferença estatística significativa entre os grupos pré-operatório (194ng/mL ± 59,48) e controle (358ng/mL ± 109; p=0,01). Também se observou redução dos níveis de IGF-I para os obesos do grupo pós-operatório (140ng/mL ± 90,94), quando comparados ao grupo dos obesos no período pré-operatório (194ng/mL ± 59,48; p=0,01).  Em relação a esta variável, dos dez pacientes obesos avaliados no período pós-operatório, apenas dois pacientes apresentaram um aumento no nível deste peptídeo no tempo de 45 dias de seguimento da cirurgia bariátrica. Houve diferença estatística significante (p=0,0005) entre o grupo controle (358ng/mL ± 109) e o grupo pós-operatório (140ng/mL ± 90,94).

DISCUSSÃO

Vários estudos têm demonstrado que a obesidade vem aumentando expressivamente em ambos os sexos, em todas as faixas etárias, raças, condição socioeconômica e educacional 12,13,14,15.

Francischetti 17 mostraram que, em países desenvolvidos como os Estados Unidos e a Suécia, a obesidade e o sobrepeso afetam quase a metade da população adulta, sendo responsáveis por 8 a 10% dos custos totais despendidos com a saúde 12. Em países em desenvolvimento como o Brasil, a situação não é muito diferente e o que se tem observado é um aumento expressivo da prevalência de obesidade nas últimas décadas. Segundo o mapeamento da obesidade feito em 2007 pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, 51% da população brasileira estão acima do peso e 12% são obesos16. Sichieri 18 no estudo sobre os custos da hospitalização relacionada ao sobrepeso e à obesidade, obtiveram valores estimados por dados das hospitalizações de pessoas na faixa de 20 a 60 anos do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde, sendo de 6,8% a 9,3% dos custos em relação aos demais motivos de hospitalização, excluindo as gestantes 17.

Devido a esse crescente número de pessoas com obesidade, vem aumentando também o número de pessoas que apresentam resistência à insulina, diabetes mellitus tipo II e doenças cardiovasculares. Carneiro 18 afirmaram que a maior prevalência de hipertensão na obesidade tem sido atribuída à hiperinsulinemia decorrente da resistência à insulina presente nesses indivíduos, principalmente naqueles que apresentam excesso de gordura na região do tronco. A hiperinsulinemia promove ativação do sistema nervoso simpático e reabsorção tubular de sódio, o que contribui para aumentar a resistência vascular periférica e a pressão arterial18.

Estudos têm mostrado que, quando os tratamentos convencionais para a redução do peso corporal e o controle da obesidade em longo prazo foram ineficazes, o tratamento cirúrgico representou a terapia mais efetiva, promovendo perda de peso significativa e sustentada, bem como resolução das comorbidades a ela associadas 2.

Neste estudo, foi avaliada a influência da cirurgia bariátrica nos níveis de insulina, glicemia e IGF-I, para melhor compreender o papel de cada um dos elementos envolvidos na fisiopatologia da obesidade e, desta maneira, fornecer subsídios para o tratamento e a prevenção da resistência à insulina e da obesidade que são fatores predisponentes às doenças cardiovasculares.

Os valores de IMC encontrados nessa casuística estão de acordo com a maioria dos estudos publicados em relação aos pacientes candidatos e submetidos à cirurgia bariátrica.

A técnica cirúrgica eleita para este estudo foi a BPGYRL, que se trata de um procedimento cirúrgico que associa componente restritivo a um processo de diminuição da absorção intestinal. Esta técnica tem sido apontada em vários estudos como “padrão ouro” dentre as técnicas cirúrgicas bariátricas, devido ao bom resultado que promove em termos de perda de peso e de complicações administráveis no seguimento tardio pós-operatório2,13. Foi observada no seguimento estudado uma redução significativa do peso corporal para os pacientes submetidos à referida técnica cirúrgica.

Maior importância tem sido dada ao papel da insulina e da insulinoresistência na obesidade, uma vez que se tem observado que nesta condição há um hiperinsulinismo que traduz a resistência à insulina nos receptores celulares. A resistência à insulina pode ser uma condição genética ou adquirida, que leva a uma captação subnormal de glicose pelas células, especialmente pelas células musculares e gordurosas, embora estando as concentrações de insulina em níveis normais. Harrela (2002) afirmou que a hiperinsulinemia e a resistência à insulina são os principais fatores dentro da patogênese da doença cardiovascular e que na maioria das vezes são silenciosos 19.

Segundo Geloneze; Pareja (2006), a obesidade mórbida é um estado que ocasiona resistência à insulina. Afirmaram esses autores que nessa condição sempre há um excesso de gordura visceral e que a resistência à insulina e a adiposidade visceral contribuem para a prevalência da síndrome metabólica na quase totalidade dos pacientes com obesidade mórbida ou grau III 20. Cesaretti; Kohlmann Jr. (2006), em estudo com modelos experimentais de resistência à insulina e obesidade, afirmaram que o pâncreas passa a produzir mais insulina em consequência a uma menor captação de glicose, buscando a manutenção dos níveis glicêmicos normais, levando assim o organismo a uma situação de hiperinsulinemia15. Essa ineficácia metabólica leva o fígado a produzir mais glicose, o músculo a utilizar de maneira insuficientemente a glicose circulante e o tecido adiposo a aumentar a lipólise. Carmo (2002) apresentou, em seu estudo sobre obesidade, que esta ineficácia do metabolismo na obesidade pode ser causa e conseqüência, relatando que a hiperinsulinemia é compensadora e que por sua vez leva a uma alteração nos receptores de membrana para a insulina, mas que essa condição é passível de correção com a perda de peso e o exercício físico 21.

Em acordo com os trabalhos referidos, entre a população deste estudo, foram avaliados pacientes obesos, normoglicêmicos, que em média não apresentavam hiperglicemia no período pré-operatório, porém, apresentando um quadro de hiperinsulinemia e que, após a cirurgia bariátrica, apesar da redução do peso corporal e do IMC, não houve alteração significativa dos níveis de glicemia, como houve em relação aos níveis de insulina. Também foi observado no seguimento pós-operatório estudado que a resistência à insulina (RI) foi reduzida. Essa redução pode ser comprovada através do cálculo de HOMA-IR cujo valor médio pós-operatório se aproximou do valor médio do grupo controle, apesar da média de IMC ainda se mostrar dentro da faixa obesidade grau II, ou seja, > de 35.

Pereira et al (2003) avaliaram também pacientes obesos que se submeteram à cirurgia bariátrica pela técnica de BPGYRL. Os pacientes eram insulinorresistentes e hiperinsulinêmicos no estado de jejum e após um ano da cirurgia, embora apresentassem uma perda de peso de aproximadamente 40% relativo ao IMC inicial, ainda permaneceram obesos (IMC 35). Afirmaram que os pacientes normalizaram completamente a insulinemia através apenas da melhora da resistência à insulina, concluindo então ter havido armazenamento de glicose, uma vez que em jejum a oxidação de lipídios permanecia alta22. Mingnore citado por Pereira et al (2003), apresentaram que a sensibilidade à insulina após dois anos de uma derivação biliopancreática, que induz predominantemente a uma má absorção de lipídios, ainda continuava baixa, apesar de ter sido observado que o IMC final atingiu o valor normal naquele estudo. Esses autores afirmaram ainda que apesar de persistir a resistência insulínica, a secreção de insulina foi normalizada depois de redução de peso 22.

Geloneze; Pareja (2006), quando estudaram o efeito da cirurgia bariátrica na síndrome metabólica, apontaram que houve uma redução da insulinemia em torno de 54% com a técnica de BPGYRL que foi em torno de 25% em um seguimento de 10 anos, confirmando que as técnicas cirúrgicas mistas são mais eficazes na redução da insulinemia 20.

Esta eficácia da técnica mista foi confirmada entre os grupos da presente pesquisa, onde foi observado que houve uma redução significante (p=0,0189) dos níveis de insulina entre a população de obesos nos períodos pré e pós-operatório paralela à redução do peso corporal e IMC.

Este estudo corrobora a hipótese de Glagliardi (2004). Este autor afirmou que não há necessariamente elevação dos níveis de glicose circulante quando os tecidos periféricos se tornam resistentes à ação metabólica da insulina, uma vez que as células betas têm uma capacidade muito grande de aumentar a produção e a secreção de insulina, o que mantém por longo tempo uma situação metabólica de hiperinsulinismo crônico associado à normoglicemia3. Este estudo permitiu observar que, apesar dos obesos apresentarem HOMA-IR elevado, eram normoglicêmicos. Como também os resultados aqui encontrados estão de acordo com Silverthorn et al (2003), os quais mostraram que a perda moderada de peso melhora o controle da glicemia e reduz a hiperinsulinemia em cerca de 5% a 10% 23.

Com o advento de procedimentos cirúrgicos contra a obesidade, vários estudos têm se voltado para os mecanismos fisiológicos associados a tais procedimentos. Nota-se que, em cirurgias que encurtam o trânsito alimentar, ocorrendo uma chegada acelerada de nutrientes na porção distal do intestino delgado, há um aumento das taxas de incretinas na corrente sanguínea. As incretinas, hormônios gastrointestinais que fazem parte do eixo enteroinsular, potencializam a ação da insulina de forma dependente da glicose, ou seja, estimulam a secreção de insulina pós-prandial. A principal incretina liberada é a GLP-1, secretada por células L principalmente do íleo e do cólon. O GLP-1, além de estimular a secreção de insulina, aumenta a população de células beta e mantém a função destas, suprime a liberação de glucagon, desacelera o esvaziamento gástrico e reduz o consumo de alimentos. Estudos ainda relatam que a elevada taxa de GLP-1 no sangue contribui para um aumento expressivo de sensibilidade à insulina 24,25,26,27,28,29. É provável que tais mecanismos estejam envolvidos na melhora observada na sensibilidade à insulina nos pacientes do grupo pós-operatório desta pesquisa.

Ainda dentre os mecanismos hormonais envolvidos na síndrome metabólica, merece destaque a participação do IGF-I, o mais potente fator de crescimento, que tem ação semelhante à insulina e que apresenta repercussões endócrino-metabólicas também importantes e complexas, juntamente com a insulina. O fator de crescimento semelhante à insulina I (IGF-I), produzido principalmente no fígado sob a ação do GH, participa do crescimento e da função de quase todos os órgãos, inclusive tecido adiposo. São peptídeos com atividade promotora de crescimento e diferenciação de tecidos além de terem efeitos metabólicos semelhantes aos da insulina. Segundo Guadarrama et al (2003), Lima et al (2004) e Menezes et al (2004), há muito pouco IGF livre, sendo encontrados na circulação associados às proteínas (IGFBP-1 a IGFBP-6), mas que ainda não se conhecem bem suas funções30,31,32..

Entre as populações de eutróficos e obesos acompanhadas neste estudo, foi encontrada uma diferença significante nos níveis séricos de IGF-I, sendo esses mais baixos nos obesos em relação aos eutróficos. Já no seguimento pós-operatório de 45 dias, foi observada uma redução ainda maior dos níveis de IGF-I quando comparados aos indivíduos eutróficos.

Britt  33 estudaram o eixo GH/IGF-I em obesos no seguimento de seis e doze meses após cirurgia bariátrica com a técnica de Capella e cotejaram com indivíduos com diagnóstico de deficiência de GH. Concluíram que o GH no obeso está diminuído e se comporta como na deficiência de GH (DGH). Naquele período de estudo, observaram redução do IMC e aumento do GH e IGF-I nas mulheres em seis meses e em ambos os sexos em doze meses após a cirurgia. Esses autores relataram ainda que os valores de GH/IGF-I, encontrados nos homens antes da cirurgia, eram semelhantes aos valores encontrados nos indivíduos com DGH, sendo que esse nível nas mulheres, apesar de baixos, estavam mais elevados que o nível dos homens, estando abaixo do valor de referência para as idades. Assim, concluíram que a cirurgia reduz o peso e restabelece o nível de GH33. A normalização dos níveis de IGF-I com 12 meses naquele estudo e não encontrada em 45 dias de pós-operatório nesta pesquisa suscita a realização de novas pesquisas com dose amento do referido escore no pós-operatório tardio.

Segundo Matos et al (2003), o GH é um dos principais componentes do eixo somatotrópico e sua ação se dá primariamente através da regulação periférica do IGF-I. O GH possui uma ação direta na maioria das células do corpo humano e, sendo assim, sua deficiência, tal como seu excesso, leva não somente a modificações no crescimento, mas também a uma ampla variedade de distúrbios metabólicos34. Assim também afirmaram Halpern et al (2006) em estudo sobre o efeito do hormônio do crescimento em parâmetros antropométricos e metabólicos na obesidade andróide, que pacientes obesos apresentam níveis plasmáticos de GH diminuídos e resposta diminuída a vários testes de estímulos 14.

Esperava-se, nesta casuística, que o nível de IGF-I entre os obesos no período pré-operatório se apresentasse inferior aos níveis de IGF-I do grupo controle, porém esperava-se também que, após os 45 dias da cirurgia bariátrica, com a redução do peso corporal, os níveis de IGF-I se aproximassem dos valores normais (grupo controle). O que ficou constatado foi que, mesmo com uma redução significativa de peso que ocorreu nesse período de estudo, os valores de IGF-I continuaram decrescendo.

Guadarrama et al (2003) sugeriram que uma das funções do IGF-I é o controle da secreção do hormônio de crescimento e que, quando a concentração de IGF-I está baixa, há o estímulo para a secreção de GH30. Isto sugere que o tempo de 45 dias de pós-operatório de cirurgia bariátrica, estipulado para este estudo, pode ainda não ter sido suficiente para que se houvesse a normalização dos níveis de GH, justificando assim os valores ainda baixos de IGF-I na casuística estudada, uma vez que estudos anteriores mostram que sua concentração tem correlação com a concentração do GH.

Por outro lado, Barreto Filho et al (2005) apontaram para o fato de que a hiperinsulinemia inibiria a liberação de GH e bloquearia também a síntese das IGFBPs pelo fígado, podendo causar aumento da fração livre do IGF-I35. Ao contrário do que afirmaram aqueles, em nossa casuística foi observado que os níveis de insulina foram elevados no período pré-operatório e os níveis de IGF-I reduzidos e, com a redução do peso e do IMC após a cirurgia bariátrica, reduziram os níveis de insulina e ainda mais os níveis de IGF-I no período pós-operatório.

Outros estudos são necessários com uma amostragem maior e em um seguimento de maior tempo pós-operatório, para que se possa ter uma melhor compreensão do comportamento metabólico dos pacientes após a redução de peso induzida pela cirurgia bariátrica através da técnica BPGYRL.

Em conclusão, a cirurgia bariátrica através da técnica de BPGYRL induz à redução de peso e IMC em curto espaço de tempo, além de reduzir também os níveis de insulina e da resistência insulínica no seguimento do estudo, atingindo valores de pós-operatório semelhantes aos indivíduos do grupo controle. Porém, tais fatos não comprometem os níveis normais de glicemia pré-operatória, permanecendo também normais no pós-operatório.

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