Erosão da parede gástrica no contexto de slippage

José Barbosa, Silvestre Carneiro, Eduardo Lima da Costa, Oliveira Alves, Cidália Gil, Costa Maia

Serviço de Cirurgia Geral do Hospital de S. João, Faculdade de Medicina do Porto (FMUP), Portugal

Introdução: A erosão da parede gástrica é uma das complicações que podem ocorrer no âmbito da morbilidade da gastroplastia com banda ajustável, podendo conduzir a uma migração intragástrica de banda ou constituir uma urgência cirúrgica como no caso da erosão parietal no contexto de slippage. A etiologia da primeira crê-se que se relaciona com o manuseamento operatório com lesão parietal no momento da colocação da banda, com a calibração da mesma ou mesmo como reacção de corpo estranho.

José Adelino Lobarinhas Barbosa. Morada:

Rua Sol Ponte, 656 – R 4450-794 Leça da Palmeira. Matosinhos - Portugal.

No caso de erosão da parede no contexto de slippage a etiologia parece relacionar-se a comprometimento vascular pelo próprio deslizamento do estômago. Os autores apresentam um caso de desenvolvimento de slippage, 3 meses após calibração sob controle radiológico e em que ocorreu necrose parietal ao longo de parte da região em contacto com a banda.

Palavras chave: Obesidade mórbida, laparoscopia, banda gástrica, erosão gástrica, slip

Caso Clínico.- Doente do sexo feminino de 38 anos de idade com IMC-49, submetida a colocação de banda gástrica ajustável por laparoscopia em Junho de 2008 com Lap-Band ®. O pós-operatório decorreu sem incidentes e a paciente teve alta 48 horas.

A perda de peso decorreu de forma gradual e satisfatória durante os primeiros seis meses pelo que não foi realizada qualquer calibração mantendo-se apenas em vigilância regular pelo cirurgião e nutricionista. Em Fevereiro de 2009 foi efectuada calibração e em Setembro de 2009 devido a nova paragem na perda de peso foi submetida a outra calibração sob controle radiológico (Fig. 1)

Até Novembro de 2009 sofreu episódios infrequentes de vómitos alimentares pós-prandeais de alimentos não digeridos a que não atribuiu importância mas que motivou a realização de Rx abdominal simples a pedido do cirurgião para despiste de sinais indirectos de qualquer alteração (Fig. 2). Em 22 de Janeiro de 2010, por apresentar queixas de dor epigástrica contactou o cirurgião que a enviou ao serviço de urgência do Hospital de S. João. Após a admissão realizou-se Rx abdominal simples que demonstrou sinais indirectos de provável slippage de banda, tal como se pode comprovar pela comparação dos exames realizados em Novembro 2009 e em Janeiro 2010 (Fig. 2 e 3)

Como o estudo analítico demonstrou a presença de valores elevados de marcadores inflamatórios foi decidido o internamento da doente e realização de endoscopia digestiva alta. Esta evidenciou: “ Esófago com grande quantidade de líquido de estase e erosões lineares na sua região terminal; bolsa gástrica de grandes dimensões, com recesso, acima de área de compressão pela banda. A mucosa apresenta-se congestiva, friável e com áreas erosionadas. A cavidade gástrica distal à impressão da banda tem aspecto normal bem como o piloro e o duodeno”.

Em face deste quadro foi realizada descalibração da banda e a doente ficou com soroterapia, antibioterapia profilática e dieta zero. Como a sintomatologia dolorosa desaparecesse com as medidas instituídas e não ocorresse agravamento dos parâmetros inflamatórios e hemodinâmicos foi realizada tentativa de alimentação oral que não foi tolerada.

Foi então programada cirurgia para tratamento do slippage. Na laparoscopia exploradora encontrou-se volumosa dilatação gástrica acima da banda com múltiplas aderências à face inferior do lobo esquerdo do fígado. Após identificação da banda gástrica foi conseguida a sua extração mas verificou-se que o segmento lateroposterior esquerdo do leito da banda se apresentava com necrose da parede gástrica pelo que foi necessário proceder a exérese dos tecidos necrosados e posterior sutura.

O pós-operatório decorreu sem incidentes e a doente teve alta ao 6 DPO após comprovação de melhoramento dos parâmetros inflamatórios e confirmação de estanquicidade da sutura gástrica com RX contrastado com gastrografina que não evidenciou alterações do esvaziamento gástrico ou presença de fugas de contraste. Foi observada em consulta externa 15 e 30 dias após a cirurgia e encontrava-se assintomática.

Discussão e Conclusão.- Os autores descrevem um caso clínico que se desenvolveu após a segunda calibração de banda mas sem que se possa estabelecer uma relação causal com o procedimento em si, uma vez que em Rx realizado cerca de 2 meses após não existiam sinais indirectos ou directos de que estivesse a ocorrer qualquer alteração.

A súbita instalação de dor epigástrica foi o sinal de alerta para a realização de novo exame radiológico que neste momento já evidenciava sinais indirectos de alterações significativas. A associação de subida de marcadores inflamatórios justificou a imediata realização de endoscopia e o internamento do doente, que se veio a revelar adequado mesmo com a descalibração da banda.

Esta conjugação de dados clínicos alerta para a necessidade desse internamento sempre que a subida de sinais inflamatórios se associe a sinais de congestionamento da mucosa gástrica.

O desenvolvimento desta complicação tardia demonstra-nos também que embora a colocação de banda gástrica seja relativamente inócua, a existência de morbilidade nesta forma de cirurgia bariátrica pode acompanhar-se de gravidade e habitualmente com necessidade de recurso a cirurgia para a sua resolução.

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